PARA ALÉM DO BEM E DO MAL
O conteúdo da Carta
Política de 1988, especialmente na redação do seu artigo 5º, muito além de
representar uma declaração brasileira dos direitos humanos é fruto de uma longa
luta histórica dos homens na busca da afirmação de seus direitos fundamentais.
O grande marco desta luta sem dúvidas o encontramos na Revolução Francesa de
1789, porém sua formação se deu mediante processo contínuo no qual muitas vidas
foram ceifadas e muitas gerações tolhidas do exercício mais básico de seus
direitos. A todos eles devemos a moderna posição de respeito indeclinável do
ordenamento jurídico brasileiro aos direitos fundamentais, dentre os quais
chamamos atenção à primeira geração deles simbolizada pelas diversas formas de
liberdade, tanto de ir e vir, mas também de pensar e expressar suas opiniões.
Se o francês Rousseu é símbolo desse marco, por certo se contam aos milhares as
almas que abdicaram da vida para que possamos nos expressar livremente hoje.
Nesta seara, ditas
liberdades deverão necessariamente ser compreendidas como os alicerces mais
fundamentais da democracia brasileira como um todo e das nossas instituições de
uma maneira geral. É dizer que as instituições nacionais, todas por princípio
democráticas, existem enquanto mecanismo de formação, aperfeiçoamento e
manutenção da democracia mesma, o que equivale a dizer que não representam fim
em si mesmo, mas mecanismos necessários à formação do país idealizado pela
Constituição Federal. Se assim é, pois então igualmente será preciso reconhecer-se
que as autoridades que encarnam as vontades e as ações das instituições
nacionais deverão igualmente servir de instrumentos à efetivação dos princípios
que forjam a República Federativa do Brasil, dentre os quais destacamos os da
cidadania e do pluralismo político, logo da diversidade de opiniões
expressamente consagrado, aliás, no art. 5º, IV da predita Constituição.
Por isso os
detentores dos poderes temporais, incluindo todas as autoridades vinculadas a
todos os Poderes dos entes políticos brasileiros (dentre o que incluímos os
magistrados e membros do Ministério Público) precisam exercitar suas
atribuições imbuídos dos princípios e espírito democráticos, razão porque, tal
qual todas as pessoas humanas e na mesma medida que todas as demais autoridades
eletivas, deverão resignar-se às críticas que lhe venham a ser lançadas. A
imprensa é não somente o grande fiscal das nossas instituições e autoridades,
mas também o órgão responsável por lançar na sociedade as sementes das mais
profundas reflexões, as quais são indispensáveis ao amadurecimento da nossa
democracia e instituições. Autoridade pública que não aceita críticas é no
mínimo antidemocrática e quiçá esteja a demonstrar sua indignidade no exercício
das respectivas atribuições, que nesta qualidade deverão ser compreendidas como
deveres-poderes e não como mera potesta
que as tornaria imunes às críticas da sociedade. Na mesma medida, autoridades
que lançam mão do constrangimento de ações judiciais enquanto mecanismo de
intimidação das pessoas que contra si lançam críticas, são igualmente
antidemocráticas e indignas de suas funções.
Nossas autoridades em
geral e nenhuma delas em especial (repita-se, nem os promotores de justiça)
estão acima do bem e do mal, sendo na realidade cidadãos no exercício de
poderes, cuja única razão é o cumprimento dos deveres para os quais foram
incumbidos. E chega de arrogância, porque neste caso quem findará por pagar o
preço será a própria sociedade brasileira...
Jorge Emicles Pinheiro Paes Barreto
Advogado, Professor Universitário e Radialista.
Nenhum comentário:
Postar um comentário