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quarta-feira, 21 de novembro de 2012


O CANAL DA VERGONHA
Jorge Emicles Pinheiro
                                 No início da década de quarenta, na cidade do Crato, era comum as pessoas se banharem às margens do Rio Grangeiro, que manso acumulava as águas das nascentes do pé da chapada e as direcionava ao rio Salgado, que por sua vez alimentava o Jaguaribe, que morria no mar. Era a diversão, ao final das tardes quentes, de muitas das boas famílias da Vila Real. Hoje somente pensar na imagem de pessoas se banhando no canal do rio Grangeiro simplesmente causa repugnância. Eis um exemplo deplorável, mas ao mesmo tempo induvidoso da catástrofe que a ignorância humana pode causar.
                                 Num tempo onde o homem era ilimitado, que tudo poderia e no qual não cabia consciência do ambiente como um conjunto da vida, que para se preservar exige sustentabilidade, os grandes líderes do Crato na busca da modernidade, literalmente encaixotaram o velho rio, que desde então passou também a ser alimentado com os dejetos da cidade, virando o depósito de todas as podridões da urbe em crescimento. Mau sabiam que o eleito símbolo do progresso na verdade acabaria representando o fracasso de várias gerações de políticos, empresários e pensadores, que na verdade, ajudaram a história a conduzir o Crato para um ostracismo que se infiltrou nas entranhas de seu povo a tal grau que serão preciso mais que várias gerações futuras para apagar-se de sua memória. A sujeira do rio passou também a contaminar a alma do povo cratense, que desde então viveu no mesmo grau do velho Grangeiro, a decadência e a podridão de seguidas e péssimas administrações. O ocaso se formou e chegou.
                                 Não seria de acordo com a verdade a desmemória ao brilhante trabalho realizado pelo ex-prefeito Raimundo Bezerra, quem se incumbiu de encomendar um belíssimo projeto de reurbanização do rio, limpando-o dos dejetos e organizando seu leito. O projeto do saudoso Raimundo Bezerra, além de prever a coleta separada dos esgotos que com a mesma naturalidade da força gravitacional correm para o seu leito, ainda pensou num projeto arquitetônico muito parecido com o idealizado por outro grande cratense, Júlio Saraiva, que já na década de quarenta pensava da necessidade de urbanizar-se o entorno do rio urbano do Crato. Dito projeto, como se percebe, idealizado em harmonioso acordo com as idéias de sustentabilidade e de respeito ao meio ambiente dos tempos contemporâneos, infelizmente somente pôde ser executado anos mais tarde. Pior que tudo, foi executado por um legítimo representante das forças do atraso em Crato, aqueles mesmos que confundiram desenvolvimento com poluição. Por isso não foi nada difícil a deformação do projeto, com a retirada do coletor de esgotos e a baixa qualidade da construção, como hoje é de pública e notória observação. Mas a inauguração foi com estardalhaço e a campanha eleitoral daquele ano trouxe como maior símbolo da administração Walter Peixoto exatamente as obras de reforma e ampliação do canal do rio Grangeiro, as quais ao vultoso preço de mais de cinco milhões de reais na realidade é o símbolo do maior crime ecológico cometido pela administração pública municipal, realizado às claras, financiado com dinheiro público e festejado como um grande feito do ex-prefeito.
                                 Agora que aquela antiga campanha está bastante distante da memória do cidadão (lá se foram mais oito anos), assistimos perplexos aos correligionário do ex-prefeito indo à imprensa, indignados com o atual estado das coisas no canal do rio Grangeiro, culpando ostensivamente o atual prefeito pela bagunça , falta de estrutura, segurança para a população e feiúra do local.

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