VALSA
DOS ADEUSES
POESIA
EM PROSA
Dois
à frente, um para trás. Assim como a dança, segue a vida, avante mas
contornando e retrocedendo. O que já foi será, e ainda melhor. O que já era,
nunca poderá ter sido.
Dois à frente, um para trás. Dois à trás, nenhum
adiante. Diferente da dança, a vida tem um ritmo próprio, em aparência fora de
compasso, mas que segue o rigor absoluto da perfeição cósmica.
Dois à frente, pausa. A vida, infinita enquanto
dádiva divina, dá pausas sempre, às vezes provisórias, outras quase
definitivas. Enquanto uns se vão, outros retornam e tantos paralisam. Mas a
inércia não é absoluta, porque absoluto mesmo é a eterna mutação de tudo que há
na matéria. Tudo passa, afinal.
Dois atrás, dois atrás, dois atrás. Há o tempo de
más colheitas, sequência de péssimas semeaduras. Mas é que temos o direito de escolher
os valores de que gostamos, as ideias que veneramos e as pessoas a quem amamos.
Colher espinhos plantando flores é sempre mais útil e digno, pois é promessa para
a próxima seara.
Dois adiante, um à frente, dois adiante. Quando se
azeita a máquina da vida e se dilapida dela todas as coisas inúteis e
supérfluas, sobra o objetivo maior da existência, que é a busca do caminho de volta
para onde viemos. Um lugar esquecido, mas não desconhecido dos homens. Um lugar
inacessível, perigoso e distante, mas ao mesmo tempo tão próximo, porque
escondido está no âmago mais profundo de cada um de nós. Homem, conhece a ti mesmo.
A cada passo que damos, um burburinho de renovação
se forma. É tudo novo, sempre. A vida se renova, destroça e refaz. Incessantemente
num perpassar eterno das vibrações cósmicas. Do que não nos damos conta de
verdade, é que cada novo deslocamento é a despedida de todos os que o
antecederam.
Para que o novo venha, é imprescindível a
despedida do velho que o alicerça, fundamenta ou, talvez, o antagoniza. É de
adeuses que vivemos.
Jorge
Emicles
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