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domingo, 18 de agosto de 2019


UM SONETO QUÂNTICO



Vi. Não porque tenho olhos,
Mas por ser capaz de enxergar
Que envolto em mil silêncios
Um novo deu em desabrochar.

Senti. Não por possuir nervos
Mas por de dentro fazer desfecho:
Do que era não somos escravos.
O mundo finda voltando ao eixo.

Vivi. Não porque tenho carne
Mas porque continuaremos a existir
Mesmo despois do remate.

Respiro. Não por pulmões possuir
Mas pela fé petrificada n’alma
De que nunca sessarei de existir.
Jorge Emicles

domingo, 4 de agosto de 2019


UNIVERSOS PARALELOS



                   De repente veio o desejo de engolir todo o vento do mundo. Numa golada sofrida de ar inspirou profundamente, como se houvesse a real necessidade de pôr para dentro de uma única vez todo o oxigênio necessário para a vida inteira. Naturalmente foi frustrado o intento, pois houve um momento, logo no início, em que os pulmões, encharcados de matéria prima pararam de sorvê-la.
                   Mas existiu um tempo em que aquela mesma criatura possuía dilação brônquia imensamente superior. Assim como aptidões aeróbicas bem mais potentes. Era um tempo de vigor físico, mental e espiritual, do qual restara apenas a saudade profunda e a tardia consciência do potentado do qual já foi senhor.
                   Mas e quem seria ele, afinal? Aquele senhor no caminho da senilidade ou o jovem prepotente e forte que guardava nas sedutoras lembranças da juventude que, apesar de inexistente no tempo do presente, era em quem se reconhecia? O pretérito mancebo não poderia estar extinto, pois não haverá ser possível a lembrança do que não existe. Vem de Hermes, afinal, a sabedoria de que no Universo, todas as coisas já estão criadas. É de Platão a evidência de que a essência das coisas é imutável e eterna.
                   Ilusão é perceber o perpassar das coisas.
                   Dentro de cada consciência há todas as coisas de todos os tempos. Estará contido uma infinidade de universos paralelos, de histórias dissonantes e contraditórias, que guardam uma impossível coerência unitária. No um todas as coisas são simples, consistentes e absolutamente conciliáveis.
                   Assim como a consciência da nossa personagem forma uma infinidade de universos que habita harmoniosamente no inesgotável espaço de um coração solitário, também a consciência de todos os outros seres, viventes ou não, encerram a mesma improvável realidade. Somos infinitos de infinitesimais universos.
                   Cada qual com suas incontáveis certezas, verdades e desilusões.
                   Está entre os ensinamentos pitagóricos a fórmula de que o zero, quando multiplicado pelo infinito resulta em um. O Um Criador, fonte primeira de todas as coisas havidas e por haver. Mas e quanto seria a multiplicação da infinidade de universos paralelos pelo infinito de sua quantidade?
                   De novo, teria de resultar no mesmo Um. Naquela unidade que tem cem nomes.
Jorge Emicles