UNIVERSOS
PARALELOS
De repente veio o desejo de engolir todo o vento
do mundo. Numa golada sofrida de ar inspirou profundamente, como se houvesse a
real necessidade de pôr para dentro de uma única vez todo o oxigênio necessário
para a vida inteira. Naturalmente foi frustrado o intento, pois houve um
momento, logo no início, em que os pulmões, encharcados de matéria prima pararam
de sorvê-la.
Mas existiu um tempo em que aquela mesma criatura possuía
dilação brônquia imensamente superior. Assim como aptidões aeróbicas bem mais
potentes. Era um tempo de vigor físico, mental e espiritual, do qual restara
apenas a saudade profunda e a tardia consciência do potentado do qual já foi senhor.
Mas e quem seria ele, afinal? Aquele senhor no
caminho da senilidade ou o jovem prepotente e forte que guardava nas sedutoras
lembranças da juventude que, apesar de inexistente no tempo do presente, era em
quem se reconhecia? O pretérito mancebo não poderia estar extinto, pois não haverá
ser possível a lembrança do que não existe. Vem de Hermes, afinal, a sabedoria
de que no Universo, todas as coisas já estão criadas. É de Platão a evidência
de que a essência das coisas é imutável e eterna.
Ilusão é perceber o perpassar das coisas.
Dentro de cada consciência há todas as coisas de
todos os tempos. Estará contido uma infinidade de universos paralelos, de histórias
dissonantes e contraditórias, que guardam uma impossível coerência unitária. No
um todas as coisas são simples, consistentes e absolutamente conciliáveis.
Assim como a consciência da nossa personagem forma
uma infinidade de universos que habita harmoniosamente no inesgotável espaço de
um coração solitário, também a consciência de todos os outros seres, viventes
ou não, encerram a mesma improvável realidade. Somos infinitos de infinitesimais
universos.
Cada qual com suas incontáveis certezas, verdades
e desilusões.
Está entre os ensinamentos pitagóricos a fórmula
de que o zero, quando multiplicado pelo infinito resulta em um. O Um Criador,
fonte primeira de todas as coisas havidas e por haver. Mas e quanto seria a
multiplicação da infinidade de universos paralelos pelo infinito de sua
quantidade?
De novo, teria de resultar no mesmo Um. Naquela
unidade que tem cem nomes.
Jorge Emicles