REMINISCÊNCIAS
Há uma noite a menos na cúpula de minha
insólita existência. As horas são lentas, às vezes tão letárgicas e
incalculáveis que nos enfadam e iludem pretendendo-se infinitas. Mas cada hora
a mais representa o mesmo tempo a menos da existência e cada missão adiada
significa a renúncia a algum afazer, tantas vezes tolo e banal, outras porém
imprescindível à pretendida eternidade.
A verdade mesma; a cruenta, insensível e
pernóstica verdade, é que apenas descobriremos o quanto é insignificante a
pueril história de nossa existência pessoal quando ela já tiver se esgotado
totalmente. Há um completo abandono de si mesmo e em si mesmo, pois o que
queremos da vida não é nada. Ela nada significaria não fosse finita, inútil, frívolo
e impossível desejo de imortalidade.
Nossas mães estrelas, entretanto, são tão
inalcançáveis pela vastidão do Universo, que nem nossa galopante imaginação
jamais será capaz de presumir o confim mais distante e desassossegado do cosmo.
Nada existirá para além da nossa consciência? E em reverso, tudo o que pensamos
há? Há então, aquele mundo paralelo, de luz pujante, sabedoria incomparável e
beleza indescritível que alicerço em minha podre mente? Não há mais o
pernóstico sentimento de sofrimento que decreto seja extirpado de minhas
entranhas tão despoticamente quanto o mais vulgar dos tiranos decreta a morte
de seus conselheiros mais temíveis?
Decreto vão; ignóbil este, pois não se
invalida o que se emprenha na própria essência. Que horror, pois segue
existindo dentro de mim o que dentro de mim suicidei. Não se nega o sentimento
mais legítimo, tanto quanto não se omite a maré da irresistível força
gravitacional da charmosa lua.
Ah, aquela lua! Redonda, bela, prateada
que boia na vastidão da noite pululada por um ror incontável de estrelas. As
estrelas, todas elas, são presumidamente maiores que a lua. Da nossa
perspectiva, no entanto, é a lua que não passa indiferente diante da nossa
acabrunhada vista. É a lua, a pequena filha das estrelas (tal como nós), não a
mãe de toda a matéria cósmica, quem é imprescindível aos enamorados;
irresistível às águas e ao próprio ciclo de vida do nosso pequeno planeta.
Vês, assim, como é míope a nossa visão do
mundo e da vida?
Jorge Emicles Pinheiro
Paes Barreto
Refletir tão aprofundadamente a existência é ato de incrível peso. Admiro a coragem nestes mergulhos.
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