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segunda-feira, 17 de novembro de 2014




ELES NÃO ME REPRESENTAM

                   Os vinte e oito anos da URCA são anos de lutas, conquistas e vitórias, todas imprescindíveis à difícil afirmação de um centro de educação no interior do Nordeste brasileiro, que pratica a política de levar à população abrangida pela Universidade um ensino público, gratuito e de qualidade; razão pela qual renunciou à vencida política de instituir cursos de graduação não gratuitos. Há um preço impostergável a ser pago por ações desta grandeza, notadamente quanto ao fato de ser mantida exclusivamente com os recursos do orçamento do Estado do Ceará, que é o mesmo que dizer da imposição de uma série de limites e amarras no que se refere à gestão e limite desses recursos. A decantada autonomia universitária afirmada expressamente na própria Constituição Federal sofre severas barreiras diante de um orçamento decidido pela Assembleia Legislativa do Estado. A eleição das políticas a serem executadas pela instituição igualmente são contingenciadas por essa mesma realidade. Entretanto, essa tal realidade que aflige a toda a comunidade acadêmica da URCA é lugar comum a toda e qualquer Universidade pública deste país. Que o digam as outras Universidades do Estado do Ceará; que o confirme a realidade precária das Universidades Federais país afora.
                   Falar das dificuldades, no entanto, não é igual a negar os avanços e conquistas de vinte e oito anos de história. Aquela insipiente instituição precariamente fundada no longínquo ano de 1986, que oferecia cursos exclusivamente noturnos, que possuía um quadro de professores doutores e mestres quase nulo, não tinha laboratórios e qualquer renome, seja regional, seja nacional, hoje se apresenta em pleno desenvolvimento da política de formação de seus docentes, que possuem regimentalmente o direito de se licenciar por até quatro anos para cursar mestrados e doutorados país e mundo afora, sem prejuízo de sua remuneração; agora é referência mundial em matéria de paleontologia, sendo detentora material de importante museu dedicado a este estudo e, mais ainda, possui em seus quadros alguns dos mais respeitados pesquisadores na matéria (que batizaram, inclusive, espécimes inéditos no mundo); modernamente tem em pleno funcionamento um restaurante universitário, uma residência universitária, um ginásio poliesportivo, um biotério, renovou sua frota de carros; sem dizer que iniciou já várias pós-graduações, entre doutorados, mestrados e especializações; sem mencionar ainda que tem trabalhos de seus professores publicados em periódicos dos mais consagrados, além de ela mesma patrocinar outras publicações por sua conta. É todo esse conjunto de ações que a fazem estar entre as cem melhores universidades do Brasil, tendo seus cursos bem avaliados pelos padrões tanto do MEC quanto de instituições privadas (como é o caso da Editora Abril).
                   É paradoxal, mas nem parece que estamos falando da mesma Universidade que foi execrada em praça pública, pela condução em procissão de seu féretro e inumação de seu cadáver (pasmem, juntamente com o anúncio da morte prematura de pelo menos três dezenas de seus professores – que vergonha o sindicato da categoria agourar mal tão nefasto a seus próprios filiados). Para além do mau gosto da manifestação, é salutar destacar que apregoam meias verdades, pois no mesmo passo que existe carência de professores na instituição, fato grave e que merece pronto socorro do Governo do Estado, não são todos os departamentos da instituição que sofrem dessa dificuldade. Há uma inadiável e delicada discussão que necessita ser travada no âmbito da Universidade, que diz respeito à adequada distribuição da carga horária dos seus docentes. A classe dos professores não se permite ser massacrada no cumprimento de sua carga horária; não pode abrir mão de horas dedicadas ao planejamento, à pesquisa e à extensão, é verdade. Muito menos, porém, poderá se comprazer com o fato de que alguns de seus docentes com carga horária máxima e recebendo gratificação de Dedicação Exclusiva se dediquem exclusivamente oito horas à sala de aula; não prestem contas adequadamente de suas atividades e produções acadêmicas e mesmo mantenham vínculo com outras instituições da região nas ocasiões em que são legalmente proibidos de tanto.
                   Não é responsável uma greve que dura já quase seis meses (três meses entre 2013 e 2014 e mais de dois a partir de setembro do presente ano). É de se ponderar o terrível prejuízo que vem sofrendo os discentes da instituição, privados sumariamente de seus sonhos e planos para o futuro, pois o fato lhes compromete não somente a qualidade do aprendizado, como notadamente o prazo de sua formação. Já se fala no cancelamento pura e simplesmente do semestre letivo, fazendo atrasar em pelo menos seis meses a graduação de todos os seus alunos. Menos ainda se pondera o prejuízo financeiro desses alunos, alguns, os que moram fora, obrigados a sustentar a habitação local sem dela fazerem uso; outros submetidos ao constrangimento de não poderem colar grau, pois o semestre letivo tende a ser cancelado ou pelo menos postergado, mesmo que tenham tantos alunos já galgado a meritosa posição de haverem sido aprovados em concursos públicos, mestrados, exame da OAB, entre outros. Tudo, sem falar do impacto à já cambaleante economia caririense causado pela ausência de mais de dez mil alunos diariamente, a de alguma forma impulsionar a economia local.
                   Não é responsável muito menos uma greve deflagrada em pleno processo eleitoral, quando sabidamente o governador retirante não pode se comprometer para o ano civil seguinte, conforme expressamente veta a vigente Lei de Responsabilidade Fiscal. Muito menos, o eleito tem poder legal para fazer avançar qualquer compromisso com o qual tenha se empenhado. Para quem serviria uma greve deflagrada em momento jurídico-político tão inapropriado, da qual antecedentemente já se sabia que nada de concreto poderia ser conquistado, senão os enviesados, espúrios e vergonhosos dividendos políticos? Mas é legítimo e ético a deflagração de uma greve em circunstâncias tais exclusivamente com o objetivo de construir uma candidatura de oposição à Reitoria da URCA, por meio da instrumentalização do sindicato dos docentes por um partido político? Não estar-se-ia a praticar a autofagia dentro da própria instituição? Se a greve é um direito consagrado no texto da nossa Constituição, como qualquer dos outros ali também afirmados, é de ser exercida dentro dos parâmetros da responsabilidade, consciência coletiva e defesa das instituições democráticas (em uma palavra, com razoabilidade), não da maneira distorcida com a qual vem se transmudando atualmente. Nessa conjuntura, não estaria havendo abuso do direito de greve? Afinal, é o exercício responsável dos direitos, não o seu abuso, que contribui verdadeiramente para o amadurecimento das instituições democráticas.
                   As pessoas de bem já se fartaram, advirta-se, da deflagração de uma greve que faz povoar os corredores da Universidade (antes cheios de alunos, professores, aulas e sobretudo sonhos de um futuro mais promissor a todos) da desértica solidão não somente de pessoal, mas sobretudo, de propósitos e seriedade na boa condução da luta proposta. É preciso se repovoar os corredores e salas de aula da URCA, sob pena de parecer à sociedade local e ao próprio Governo que deveras de pouco ou quase nada serve o vultoso investimento que anualmente os cofres do Estado do Ceará lega à fatigada Universidade Regional do Cariri. É pela produção dos nossos docentes; é pela dedicação dos nossos alunos que provaremos a necessidade e importância para a Região do Cariri e mesmo para todo o Estado do Ceará e alhures, da sua honrosa Universidade.

                   É neste campo em que se deveria travar a verdadeira batalha, não nos corredores tristes e desertos em que a transformaram!

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