VERDADE
Há uma verdade intricada dentro de mim, que em
estando dentro do meu ser revela na verdade ele mesmo. Como não sou uma ilha no
meio de uma vastidão oceânica, (muito embora em tantas ocasiões tenha desejado
ser assim e em outras lutado bravamente para transpor a infinitude de água que
me separa dos meus pares) esta minha verdade tem algo que ver com o que é de
fato o mundo e a existência.
Sou uma alma, é dizer, uma centelha de consciência
na vastidão do universo. Sou eu, enquanto consciência, quem dá razão ao mundo.
Sem mim e sem as outras milhões de consciências que povoam este mundo e ele
simplesmente não existiria, não seria nada. Que seria de Deus sem suas
criaturas? O Incriado, ao final, necessita de suas criaturas para existir,
pois é o nosso existir que, em lhe dando consciência de si mesmo, dão sentido,
cores e razões para toda a sua Obra, a começar pelo próprio Criador.
Mas esta verdade que me povoa não é nem jamais
será igual à verdade que povoa o mundo fora de mim, muito embora fora de mim o
mundo não exista. Eu sou uma criação e uma criatura em mim mesmo. Tudo me povoa
e tudo é por mim povoado. Eu sou...
E esta verdade, o que revela de superior ciência,
senão a relativização de meu próprio ser? Sou criador de mundo infinito, que
mesmo dentro de mim tem inefáveis limites, a começar pela pequenez sórdida de
meu próprio ser. Minha criação tem meus limites, meus defeitos, minhas
angústias... Oh, não, há dores demais dentro de mim para povoar o mundo! Este
mundo há de ser terrível, posto a terrível angústia que me habita: a angústia
de ser humano, finito na matéria, nos poderes, mas infinito no pensamento e nas
quimeras.
Esta minha verdade é, com a mesma convicção que eu
próprio sou. Eu sou... algo terrível e genial ao mesmo tempo, capaz de infinitos
sacrifícios, tormentosas renúncias e desgastantes apegos. Às vezes é
desesperador ser humano, finito e infinito ao mesmo tempo; tendo de se
reconhecer humilde e tão pujante, ao mesmo tempo que o próprio Criador. Sendo,
afinal, criador do próprio mundo, infinito-finito; pobre-rico; sábio-tolo como
cada uma das células que habitam as minhas vastas entranhas, que cagam, bebem e
se regozijam dos prazeres mundanos, tanto quanto todos os meus infinitos e
iguais irmãos.
É a dor de viver, que quando em vez se transmuda
na alegria de existir...
Jorge Emicles Pinheiro Paes Barreto
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