POR
UM NOVO PARADIGMA DE MUNDO
A crise das duas últimas semanas para muito além
das suas diferentes causas possíveis e do conflito dialético patente entre os
dois brasis que se entrechocam, se xingam mutuamente e possuem visões absolutas
e completamente antagônicas da realidade, revela uma verdade mais óbvia, e
talvez por isso mesmo menos perceptível por todos.
Como é fácil parar o Brasil! Basta que o sistema
de transporte entre em colapso, seja por uma greve premeditada, seja por qualquer
catástrofe natural ou mesmo provocada pelo homem. O mundo inteiro, na verdade,
entraria em colapso em tais hipóteses. Não é uma questão exclusiva dos
brasileiros, nem consequência direta da incompetência do governo. A falta de
planejamento e inexistente visão de longo prazo da nossa sociedade até podem
ter contribuído para o caos. Mas a verdade é que esse é um dos perigosos
gargalos da globalização.
Neste mundão já sem fronteiras, onde a tecnologia
das comunicações vence com aparente facilidade todas as barreiras da distância;
onde os dois extremos do planeta podem se comunicar em tempo real, e por isso
mesmo fazer negócios ao vivo; em que a cadeia de produção é fragmentada e por isso
diversos itens de uma mesma coisa são fabricados em lugares distintos para
serem montados em um terceiro lugar ainda mais distante que todos os demais;
onde são as vantagens econômicas, medidas pelo baixo preço da mão-de-obra e
pela redução da carga tributária de cada país que determinam o lugar e o modo
de produção das riquezas; um mundo sem distâncias é ao mesmo tempo um mundo
cada vez mais dependentes não exatamente dos caminhoneiros, mas na realidade,
dos meios de transporte mecânicos e do aumento do consumo dos combustíveis
fósseis. Em uma palavra: um mundo antiecológico
Dito assim, podemos com facilidade afirmar que o
mundo contemporâneo é um mundo cego pelo lucro, fascinado pela virtualidade de
um universo eletrônico, em que as coisas não são propriamente de verdade e cada
vez menos comprometido com o equilíbrio ambiental e espiritual do planeta como
um todo e de cada indivíduo isoladamente.
A greve dos caminhoneiros do Brasil, expõe a
fragilidade do planeta inteiro, a ausência de verdadeiro compromisso ambiental
da economia como um todo e da eminente possibilidade de breve rompimento do
frágil equilíbrio não só ecológico, mas igualmente econômico e social em que
todo o planeta está perigosamente envolvido.
Falar em conceitos como o de valorizar a produção
e o consumo local, o da agrofloresta, do consumo racional dos recursos naturais
e da necessidade geral de mudança dos paradigmas da economia mundial não é um
simples discurso ecológico de uma classe de pessoas minoritária e isolada da
modernidade do mundo. Não é conversa de quem pretende graciosamente renunciar aos
pseudo confortos trazidos pela tecnologia, nem muito menos pretensão de recusa
aos avanços da ciência. Mais que tudo isso, é uma contingência de sobrevivência
da vida planetária e por conseguinte da possibilidade de a própria humanidade
como um todo e cada indivíduo isoladamente, poderem continuar sua existência
terrena.
É uma lástima que tenhamos de perder mais essa
oportunidade para enxergarmos o verdadeiro problema a nossa volta, ao invés de
nos distrairmos em debates inúteis a respeito de intervenção militar, ódio de
classes e xingamentos baratos a um governo natimorto.
Jorge
Emicles